STJ

STJ debate mudança no acesso à maconha medicinal

Por João Negromonte

Em meio a avanços na disponibilidade de óleo canabidiol (CBD) em farmácias brasileiras e ao debate sobre o papel do Estado no custeio de tratamentos à base de maconha medicinal, a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) se encontra em uma encruzilhada. 

O ministro Messod Azulay, em um recente julgamento, propôs uma revisão do salvo-conduto que permitia o autocultivo de maconha para uso terapêutico. A discussão traz à tona questões sobre autonomia dos pacientes, segurança jurídica e a evolução da percepção social em relação ao cultivo dessa planta.

A reviravolta no entendimento:

Até recentemente, o STJ havia consolidado um entendimento favorável ao autocultivo da maconha para fins medicinais, seguindo decisões das Quinta e Sexta Turmas de Ministros. No entanto, a chegada do Ministro Messod Azulay trouxe uma nova perspectiva. Sua manifestação contrária à concessão dos Habeas Corpus (HCs) de cultivo durante o julgamento levou à interrupção do processo, uma vez que um dos desembargadores convocados pediu vista.

Argumentos em debate:

O Ministro Azulay questionou a validade do HC como meio adequado para garantir o autocultivo, apontando para a possibilidade de recorrer ao poder público para obter o medicamento e à necessidade de considerar o Legislativo para avaliar a legalidade do plantio. 

Ele também levantou dúvidas sobre como seriam adquiridas as sementes, citando normativas recentes da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que restringem a importação de partes da planta.

Por outro lado, críticos do novo posicionamento enfatizam que a concessão de um HC de cultivo não equivale a uma autorização oficial para o plantio. 

Para o advogado criminalista Natan Duek, especialista em direito canábico e direito criminal: 

“Se há indivíduos que são capazes de produzir seu próprio medicamento, sem nenhum custo aos cofres públicos e nenhuma lesão à saúde pública, qual o sentido de onerar o erário com esses gastos? Não podemos esquecer que o próprio processo de importação pode resultar em atrasos e comprometer a continuidade do tratamento”.

Duek destaca ainda que a Lei Federal 8.080/1990 garante, em seu art. 7º, III, a preservação da autonomia dos pacientes na defesa de sua integridade física e moral, conferindo-lhes o direito de escolher o tratamento mais adequado ao seu quadro clínico.

A busca pela estabilidade:

A discussão ressalta preocupações com a segurança jurídica e a continuidade das políticas de saúde. 

“A mudança de entendimento em um curto espaço de tempo levanta questionamentos sobre a estabilidade das decisões judiciais e a confiança que os cidadãos podem depositar nelas. A incerteza jurídica pode impactar a eficácia dos tratamentos e a busca pelo bem-estar dos pacientes”, afirma o advogado.

Perspectivas para o futuro:

O desfecho dessa discussão pode trazer implicações significativas para o acesso a tratamentos à base de maconha medicinal. Em um cenário onde o CBD já é encontrado em farmácias e a busca por alternativas lícitas cresce, a decisão do STJ deverá considerar tanto os direitos dos pacientes quanto às complexidades legais envolvidas. 

Assim, enquanto o debate continua, o papel da maconha como planta medicinal segue desafiando paradigmas e questionando políticas que perpetuam estigmas e impactam comunidades marginalizadas.

“Chama atenção que em pleno de 2023 o cultivo de uma planta para fins exclusivamente medicinais seja tratado como algo extraordinário. A maconha é uma planta como qualquer outra, cujo plantio deveria ser permitido como qualquer pé de manjericão ou boldo. Esse raciocínio estigmatizante alimenta a ideologia da guerra às drogas e suas consequências deletérias nas periferias de todo o Brasil, criminalizando e matando jovens negros e pobres”, conclui Duek.

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