Será que agora a lei federal vem?

Uma nova lei representaria um grande avanço para os pacientes, que poderão obter os medicamentos de forma gratuita, sem precisar recorrer ao Poder Judiciário

Publicada em 19/02/2023

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Por Cintia Vernalha

O mês de janeiro terminou com a excelente notícia da conversão do PL 1.180/2019 na Lei 17.618/2023, que trata do fornecimento pelo SUS (Sistema Único de Saúde) em São Paulo de "medicamentos formulados de derivado vegetal à base de canabidiol, em associação com outras substâncias canabinóides".

Este é mais um passo importante de uma luta que começou lá em 2014, quando a primeira família conseguiu na justiça o direito de importar o óleo de cannabis para o tratamento de sua filha. 

A nova lei representa um grande avanço para os pacientes, que poderão obter os medicamentos de forma gratuita, sem precisar recorrer ao Poder Judiciário. Desde 2019, a busca por decisões judiciais para a obtenção de produtos à base de cannabis aumentou mais de 1.000% dentro do Estado de São Paulo.

Esse é um processo moroso para os pacientes e de altíssimo custo para o governo. A nova lei dará agilidade e poderá baixar os custos, uma vez que o Estado passará a negociar grandes volumes com os fornecedores.

Porém, nem tudo é perfeito. Hoje as empresas não são permitidas a plantar e produzir os medicamentos em solo nacional. O produto pode ser finalizado no País, mas os insumos devem vir do exterior. Assim, São Paulo continuará gastando valores exorbitantes para comprar produtos vindos de outros países e, o que é pior, deixará de fomentar e incentivar a indústria nacional e todos os benefícios que ela pode trazer em geração de riqueza e empregos, pagamento de tributos e desenvolvimento de pesquisas.

Vinda de um Estado com grande peso nacional, uma lei dessa prova que o governo entende que a cannabis pode ser utilizada medicinalmente e, mais do que isso, que é um dever fornecer o produto à sua população.  A lei coloca em evidência a longa recusa do governo federal em regulamentar a cannabis, mostrando que a decisão não é técnica ou sanitária, mas estritamente ideológica e política.

Há agora dois caminhos que o governo federal pode seguir:

O primeiro caminho é entender que esse assunto já está endereçado. Que os pacientes que realmente precisam do produto já encontram formas de obtê-lo e, assim sendo,  não vale a pena criar uma lei federal ou permitir a produção nacional. 

O segundo caminho é aceitar que a cannabis auxilia em diversos tratamentos e existe uma demanda interna, inclusive do próprio sistema de saúde pública, que deveria ser suprida por produtos nacionais, em vez de produtos importados. 

Neste segundo caminho, será necessária a criação de uma série de medidas para a educação da população e, principalmente, exigirá que o governo enfrente empresas e setores contrários ao tema. Caberá ao governo, também, criar incentivos tributários ou outras formas de fomento para que o mercado local se desenvolva e consiga competir com produtos estrangeiros. 

Este não é o caminho mais fácil, mas permitir o desenvolvimento dessa indústria trará grandes frutos para o Brasil que tem tudo para se tornar um grande player mundial.

Não sabemos qual será o caminho escolhido pelo governo federal e não podemos ficar esperando até a decisão da melhor alternativa. Enquanto a mudança da lei federal não vem, cabe a nós, como sociedade, exigir que outros Estados também sigam o exemplo de São Paulo. E, como indústria, cabe a nós garantir que a lei realmente seja cumprida,  os médicos do SUS estejam bem treinados e, principalmente, produtos de qualidade cheguem na mão dos pacientes. Não podemos errar. Só assim teremos aliados, ganharemos força e estaremos preparados para uma discussão nacional.

As opiniões veiculadas nesse artigo são pessoais e não correspondem, necessariamente, à posição do Sechat.

Sobre o autor:

Cintia Vernalha mora nos EUA, onde conheceu e se apaixonou pelo mercado de cannabis. Com mais de 15 anos trabalhando na área comercial de grandes corporações como Nestlé, Reckitt Benckiser e EMS, hoje une a sua paixão pela planta, a sua experiência executiva e a sua vivência em um dos maiores mercados de cannabis para assessorar empresas que desejam atuar ou melhorar seu posicionamento no Brasil.