Por Caroline Apple
A vida do cabelereiro Sérgio Jesus de Oliveira, de 60 anos, foi forjada na beleza. Talentoso e bem-sucedido, o carioca logo se aproximou da alta sociedade de Macaé (RJ). Mulheres ricas e exigentes de todos os tipos o procuravam pelo mesmo motivo: aumentar a autoestima por meio dos cortes de cabelo incríveis que Sérgio era capaz de promover. E foi nessa toada que sua vida seguiu até meados de 2019.
Mas como promover autoestima quando você se vê, praticamente, do dia para noite, com uma perna amputada? Como estimular a beleza diante de um cenário de dores alucinantes que nem mesmo os remédios alopáticos mais fortes eram capazes de sanar?
Assim tem sido a vida do cabelereiro carioca desde que sua doença arterial se agravou em julho de 2019. Foi dando um workshop em seu salão que Sérgio notou que seu pé estava vermelho, latejando. O que deveria ser uma simples ida ao hospital se tornou o início de uma jornada que está longe do fim.
No hospital, as notícias não eram promissoras. Logo que chegou teve que ouvir da enfermeira que seu caso era de amputação. Desesperado e com medo, Sérgio foi sendo submetido a diversos procedimentos para salvar sua perna, que não recebia mais irrigação. O diagnóstico era de tromboangeíte obliterante, doença associada ao tabagismo. Sérgio garante que fumou bem pouco durante a vida, mas que foi o suficiente para aflorar sua propensão à patologia.
Após três cirurgias e a aplicação intravenosa de um remédio importado da Alemanha, não teve outra saída: a perna do cabelereiro foi amputada acima do joelho. Então, sua vida começa a ser resumida em dores dilacerantes. Dores que nem tramal e morfina davam conta. Dores que o fizeram quase que morrer em vida. A baixa autoestima e depressão tornaram-se suas companheiras.
Cannabis como esperança
Foi em meio a uma rotina marcada pela dor e o processo de aceitação de não ter mais uma perna que surgiu a possibilidade de Sérgio experimentar o óleo de Cannabis. Um amigo, ao ver seu desespero, ofereceu o óleo como uma possível opção para o seu caso.
Sem pestanejar, Sérgio experimentou o óleo de Cannabis. No dia seguinte notou uma melhora significativa nas dores. Então, gradativamente, sua depressão foi o deixando, a alegria, a esperança e a resiliência o invadiram e os índices de ansiedade baixaram. A aceitação da realidade passou a ficar menos dolorosa e até voltou a trabalhar, mesmo sentado.
Sérgio entrou em contato com as associações Apepi e ABRAcannabis, que passaram a assistir o caso dele de perto. Porém, o óleo que tinha conseguido acabou. Durou 45 dias. E foram os únicos 45 dias sem dores desde que sua perna foi amputada em outubro.
Sem óleo e com toda a papelada para fazer a importação dentro dos trâmites da lei, Sérgio agora chora ao se dar conta que não tem condições financeiras para importar o medicamente. Agora, o cabelereiro quer um Habeas Corpus para plantar, porém a doença não tem sido tão compreensiva com a falta de dinheiro de Sérgio.
As dores voltaram e a perna esquerda começa a dar sinal de que as coisas não estão indo bem. E não adianta recorrer aos óleos vendidos por aí de forma clandestina. A patologia grave e rara de Sérgio exige que o óleo seja feito com a cepa correta para o seu caso, na gradação correta, para que os vasos se dilatem, o coração bombeie mais sangue e a medicação chegue até as áreas afetadas pela doença.
E, mesmo que ele plante, um óleo de qualidade só poderia ser extraído de uma boa planta após cerca de seis meses.No páreo estão associações, advogados e amigos que se compadecem e levam pequenas doses de óleo, que ele garante fazer efeito por cerca de três dias. Mas, sem recursos, Sergio segue na luta contra o que ele chama de hipocrisia e falta de democracia de acesso aos medicamentos à base de Cannabis. Para ajudar na luta, o cabelereiro e mais dois amigos estão abrindo a Rede do Bem, uma associação em Macaé para ajudar outros pacientes que precisam tanto de ajuda quanto ele.