Ministério da Saúde considera pesquisas com CBD "pobres" e pede novos estudos de longo prazo

Ouvida em audiência na Câmara, substituta do ministro Henrique Mandetta sustentou que a literatura médica atual sobre o canabidiol possui "qualidade metodológica pobre"

Publicada em 13/11/2019

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A comissão especial da Câmara dos Deputados que discute a liberação de medicamentos à base de cannabis realizou nova audiência pública nesta terça-feira (12), quando foram ouvidos representantes da Organização Mundial de Saúde, do Ministério da Saúde da Suíça, além do Dr. Elisaldo Carlini e Daniela Fortunato Rego, coordenadora de Evidências e Informações Estratégicas do Ministério da Saúde do Brasil.

Daniela substituiu o ministro da Saúde, Henrique Mandetta, que não foi à comissão. Em uma longa fala aos deputados, ela apresentou a posição técnica da pasta com relação à regulamentação da cannabis medicinal no Brasil. Em resumo: o Ministério da Saúde pede mais pesquisas de longo prazo sobre o tratamento em humanos e considera que a literatura médica atual sobre o canabidiol possui "qualidade metodológica pobre", e sobre a cannabis fitoterápica, "de baixa a moderada".

Questionada quanto a posição do Ministério sobre o plantio justamente para fins de pesquisas, ela afirmou que é possível que a pasta aprove essa demanda.

Conforme Daniela Rego, a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Ministério analisou cerca de 400 estudos nos últimos três meses. Ela afirmou que esse setor adota um serviço para apoio de tomada de decisões para garantir a "produção de evidências científicas de forma rápida a atender o gestor que precisa responder as perguntas".

Ressaltou que o departamento possui 20 anos de história, com R$ 1,5 bilhões de recursos investidos, "o que o torna um órgão fomentador de pesquisa científica". Ponderou, no entanto, que "temos poucas pesquisas científicas financiadas pelo Ministério que tentam esclarecer a temática dos medicamentos à base de cannabis, seus análogos e derivados".

Por isso, explicou Daniela, o ministro Mandetta solicitou dois estudos secundários, que são aqueles que reúnem evidências de outros estudos. Foram feitas duas "revisões rápidas", nas palavras dela, um estudo sobre o uso isolado do canabidiol e outra sobre os medicamentos à base da planta, fitoterápicos.

Também falaram na audiência Dr. Gilles Forte, secretário do Comitê de Experts em Dependência de Drogas da Organização Mundial de Saúde, e a Dra Catherine Ritter, indicada pelo Comitê de Experts e servidora do Federal Office of Public Health do governo da Suíça

Canabidiol isolado

No primeiro estudo, sobre o canabidiol, foram localizados 152 estudos, sendo que somente 20 deles atendiam ao critério de inclusão, além de 176 ensaios clínicos. Foram encontrados resultados para as seguintes doenças: epilepsia, distúrbios psiquiátricos, gastrointestinais e cardiovasculares, dores neuropáticas e insônia.

"Nossa conclusão é que recomendam-se estudos de médio e longo prazo visando avaliar a segurança do medicamento", afirmou Daniela.

"A qualidade metodológica, a partir de uma ferramenta consagrada na literatura científica, foi muito baixa, a gente considera que os estudos têm qualidade metodológica pobre", acrescentou.

Cannabis fitoterápica

Sobre a revisão para remédios à base de cannabis, ou seja, da planta inteira, ela informou que foram rastreados 192 estudos, sendo que 32 incluíam os requisitos do Ministério. As revisões são para as seguintes doenças: dor, distúrbios de movimentos, gastrointestinais, psiquiátricos e neurológicos, trato urinário, sono, glaucoma e qualidade de vida. O medicamento mais utilizado foi o THC isolado, o Drogabinol, em forma de spray, óleo, cápsulas.

"Na nossa análise, a qualidade dos estudos foi considerada de baixa a moderada, e o nível de estudo foi considerado moderado. Alguns estudos mostraram eficácia, mas a gente recomenda que haja mais estudos clínicos randomizados, com acompanhamento de médio e longo prazo, visando qualificar a eficácia do medicamento".

Daniela ressaltou que não foram incluídos estudos laboratoriais, nem foram pesquisados novos fármacos, cultivo ou evidências científicas sobre controle de qualidade.

Profissional desconhecia o Mevatyl

A coordenadora de Evidências e Informações Estratégicas do Ministério da Saúde assumiu que foi uma revisão rápida, mas que "a posição do Ministério da Saúde é estritamente baseada nas evidências científicas hoje aqui colocadas".

"O Ministério da Saúde encontrou uma evidência científica mais robusta que aponta indícios mais favoráveis, caso da epilepsia refratária. A nossa hipótese foi corroborada pela consulta ao Conselho Federal de Medicina, de Neurologia Infantil e Conselho Federal de Farmácia, e todos foram unânimes em afirmar que as evidências científicas para epilepsia refratária eram as mais robustas até então. Não significa que no futuro não possa ser alterado, inclusive o Ministério está à disposição sobre o uso do canabidiol e medicamentos à base de cannabis".

Daniela Rego foi questionada pelo deputado Paulo Teixeira (PT/SP), presidente da comissão, sobre a posição do Ministério da Saúde para o registro do medicamento Mevatyl, que desde 2017 é autorizado pela Anvisa e possui inclusive concentração maior de THC do que de CBD. A profissional, no entanto, respondeu que desconhecia esse medicamento.