Estudo não encontra ligação entre legalização da cannabis e abuso de drogas

Pesquisa derruba a teoria de que o uso adulto da maconha é a “porta de entrada” para consumo de outras substâncias

Publicada em 01/02/2023

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Por João R. Negromonte

Há cerca de 40 anos, a afirmação de que a cannabis é a “porta de entrada” para o abuso de outras drogas, permeia o imaginário da sociedade. Contudo, tal alegação vem sendo desmentida por diversas evidências e, desta vez, mais um estudo aponta que não foram encontrados vínculos causais significativos entre a legalização da cannabis e os transtornos por uso de substâncias.  

O estudo publicado no início deste ano pela Universidade de Cambridge, é chamado de “A legalização da cannabis recreativa teve efeitos limitados em uma ampla gama de resultados psicossociais e psiquiátricos adultos”. Nele, os pesquisadores quantificaram os possíveis efeitos da legalização da planta relacionado com o consumo excessivo de outras drogas nos EUA.

Foram observadas mais de 4.000 pessoas, a longo prazo e em conjuntos de gêmeos, isto é, com participantes irmãos idênticos onde 240 eram pares discordantes de residência. Desse modo, os cientistas puderam avaliar se os indivíduos suscetíveis aos efeitos da legalização da cannabis são realmente mais “vulneráveis” do que aqueles que moram em um estado não legal.

Outros pontos como problemas financeiros, saúde mental, desengajamento social e dificuldades de relacionamento, que se acreditam estarem ligados à maconha, foram considerados, além claro, se houve ou não disfunção psicológica geral por parte daqueles que consumiam frequentemente a planta. 

Os pesquisadores afirmam que apesar do consumo dos derivados da cannabis ser em grande parte elevado em lugares legalizados, não foram encontradas evidências que justificassem tal relação. Outro ponto que merece destaque, foi que o transtorno do uso de álcool diminuiu entre os jovens que residem em estados onde o uso adulto é regulamentado.

Metodologia

Os participantes do estudo foram recrutados ainda na adolescência por meio de registros de nascimento dos anos de 1972 a 1994, começando antes de 2014, quando as primeiras lojas de maconha para uso adulto (dispensários) foram inauguradas no Colorado, um dos estados pesquisados. Os pais forneceram consentimento informado quando os participantes do estudo eram menores de idade.

“Usamos um projeto de controle co-gêmeo longitudinal em 4.043 gêmeos, avaliados pela primeira vez na adolescência e agora com 24 a 49 anos de idade, atualmente residindo em estados com diferentes políticas de cannabis”, destaca o estudo.

Ainda de acordo com a pesquisa, 40% residiam em um local recreativo legal. “Testamos o efeito da legalização nos resultados de interesse e se a legalização interage com fatores de vulnerabilidade estabelecidos (idade, sexo ou psicopatologia externalizante)”.

Conclusão

“A legalização recreativa foi associada ao aumento do uso de cannabis e diminuição dos sintomas de abuso de álcool, mas não foi associada a outras más adaptações”, escreveram os pesquisadores. 

Embora viver em um estado legal tenha sido associado a um maior uso de maconha, isso não afetou o abuso de drogas. “Pelo menos do ponto de vista psicológico”, disse Stephanie Zellers, uma das pesquisadoras, ao The Colorado Sun. “Realmente, não achamos que as políticas [sobre a legalização da cannabis] tenham muita influência negativa, o que acho importante.”

“Esse componente gêmeo realmente nos permite descartar muitas alternativas possíveis – talvez houvesse apenas diferenças culturais, diferenças familiares, coisas assim”, disse Zellers, explicando a necessidade de observar gêmeos.

Os pesquisadores estipulam que são necessários mais dados para determinar os efeitos da legalização da cannabis em relação a transtornos psiquiátricos e dependência.