Empresas brasileiras estão receosas com a proposta da Anvisa para plantio de cannabis

Publicada em 12/07/2019

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Por Marcus Bruno

projeto da Anvisa para regular o plantio de cannabis com fins medicinais e pesquisa no Brasil prevê uma série de exigências que desapontaram, além das associações de pacientes, algumas empresas que aguardam essa regulamentação para investir aqui.

Entre as condições impostas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária estão o cultivo exclusivamente indoor, feito apenas por pessoa jurídica, acesso a área de plantio por biometria e monitoramento 24h. Além disso, as autorizações expiram a cada dois anos.

Para Eduardo Sampaio, CEO da Piauhy, empresa de cannabis medicinal de origem brasileira e que atua no Uruguai e em Portugal, essa lista de requisitos pode fazer o medicamento brasileiro custar tão caro quanto o importado. Ele também argumenta que essa preocupação é inerente à própria indústria farmacêutica.

"Imagina que eu vou investir x milhões de dólares. A última coisa que o empresário quer é que tenha um grama saindo desse negócio. O empresário não vai querer ninguém roubando seu material. Essa preocupação exacerbada não faz sentido. Então tem que partir do próprio empresário. É padrão da indústria farmacêutica a preocupação com a rastreabilidade, já faz parte do jeito de se fazer negócio".

Sampaio, que é natural de Brasília, está iniciando um plano de investimento de R$ 5 milhões em Portugal no próximo semestre. Bem distante dos R$ 60 milhões que a canadense Canopy Growth pretende aplicar no Brasil, conforme anunciou na quarta-feira (11). Por isso, o CEO da Piauhy tem o receio de que a proposta privilegie apenas "oligopólios".

"Eu gostaria que não se colocasse de uma forma que apenas grandes grupos internacionais participem. É uma preocupação de todo mundo, das indústrias locais, das associações. A concorrência é bem-vinda para a indústria, mas oligopólio não faz bem".

Quando a Canopy anunciou suas operações no Brasil, o médico Wellington Briques, diretor de assuntos médicos para América Latina e Caribe da empresa, disse que o "governo está de parabéns da forma como está fazendo" o processo de regulação da cannabis. 

Mais cauteloso, porém, está Caio Abreu, diretor da startup de cannabis medicinal Entourage Pyhtolab. A empresa de Valinhos, no interior de São Paulo, irá investir, somente neste ano, US$ 4 milhões no Uruguai, principalmente nas áreas de cultivo e extração. Até 2021, pretende estar com as operações em funcionamento aqui no Brasil. Mas isso pode acontecer antes.

"De largada eu vejo com muito bons olhos. A gente entende que é um movimento muito importante, estávamos esperando por isso já há alguns anos, desde 2014, quando se criou essa expectativa. Estamos acompanhando a Anvisa por conta do nosso projeto farmacêutico e, na verdade, nem tínhamos essa esperança para agora".

Abreu considera que a Anvisa foi bastante rígida, pois está preocupada com a regulamentação. Lembra que a proposta não é "estática" e pode ser aprimorada à medida que a sociedade entender melhor o uso medicinal da maconha. No entanto, ele admite que a expectativa era de que houvesse uma maior abertura de possibilidades.

Ele, assim como Eduardo Sampaio, irá encaminhar sugestões para à agência durante os 60 dias em que a consulta pública estiver aberta. No entanto, não quis adiantar que propostas fará.

"O cultivo exclusivamente indoor é algo que chama atenção pela capacidade agrícola notória (do Brasil). A gente não ter aberto essa possibilidade, de antemão é a única questão que me vem à cabeça".

A Anvisa, por sua vez, argumenta que que questões como plantio doméstico de maconha deverá ser feito no Congresso Nacional. "Nós só temos essa alternativa, legislar sobre o medicamento", afirmou o diretor-presidente da Agência, Willian Dib.

Consultas públicas foram publicadas no DOU

Foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) de sexta-feira (14/06) as duas propostas de consulta pública da Agência Nacional de Vigilância Sanitária que tratam sobre a regulação da cannabis no Brasil. As propostas podem ser feitas no site da Anvisa ou através dos correios.

A primeira consulta trata sobre o procedimento específico para registro e monitoramento de medicamentos à base de Cannabis spp. Já a segunda prevê requisitos técnicos e administrativos para o cultivo da planta com fins medicinais e científicos. Saiba como participar.

Crédito da foto: Noexcusesradio por Pixabay.