E agora?

Em sua coluna de estreia, Cintia Vernalha diz: "A resolução 327 da Anvisa foi publicada no final de 2019, mas o mercado somente sentiu seus efeitos práticos em 2021"

Publicada em 19/01/2022

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Por Cintia de Carvalho Vernalha

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), processou diversas solicitações nesse último ano e, atualmente já são 11 produtos à base de cannabis aprovados. É esperado que tais produtos cheguem às prateleiras das drogarias brasileiras nos próximos meses.

Mas e agora?

Os próximos passos serão cruciais para a formação da indústria de cannabis no Brasil. Para quem olha de fora, pode parecer que o mais difícil já passou. Mas é justamente o contrário. É agora que o jogo começa.

As indústrias que tiveram os seus medicamentos aprovados devem iniciar o processo de negociação com o varejo farmacêutico para a colocação desses produtos nas lojas. Dados do Conselho Federal de Farmácia mostram que, em 2020, havia 89.879 drogarias comerciais operando no País. Se cada loja tiver apenas uma unidade do produto de um fabricante específico, só esse fabricante terá um estoque parado de quase 90 mil produtos. Por isso, a escolha dos pontos de venda é fundamental.

Depois de ultrapassado o passo de colocar os produtos nas prateleiras, aí vem o desafio de tirá-los. Por se tratar de um medicamento controlado, a ANVISA não permite a comunicação direta com o paciente. Assim, empresas que estavam acostumadas a operar via a RDC 355, importando produtos, terão que alterar as suas estratégias de marketing. A categoria médica, que já era fundamental para o negócio, passará a ser ainda mais importante.

Hoje menos de 1% dos mais de 500 mil dos médicos licenciados no Brasil prescrevem cannabis. Levar informação de qualidade a esses potenciais prescritores, que quebre a barreira do estigma e do preconceito, será fundamental para que o mercado cresça e se fortaleça.

A boa notícia é que, se essas indústrias fizerem um bom trabalho, o jogo tende a mudar. Mais médicos prescrevendo aumentará o giro de produtos nas lojas, que aumentará a quantidade de lojas com os produtos de cannabis. Mais produtos geram o aumento da concorrência, que gera redução no preço final para os pacientes. Mais pacientes consumindo faz com que se diminua o estigma da sociedade e aumente a pressão social para que os governantes aprovem novos formatos, novas concentrações e melhorem as leis atuais. Assim, os aumentos da demanda e da oferta se retroalimentam em um ciclo virtuoso para o mercado e para todos aqueles envolvidos.

Esse ano tem tudo para ser decisivo dentro do mercado de cannabis brasileiro. Nesse sentido, as empresas devem olhar além de seus próprios interesses e se colocarem como parte de uma grande comunidade, construindo novos caminhos, compartilhando conhecimento e respondendo às questões dos consumidores de forma articulada, com uma única voz do setor. Cada empresa, independentemente do tamanho ou formato que atua, pode agregar valor à discussão. 

Como disse Benjamin Franklin: "we must all hang together or, most assuredly, we shall all hang separately". Devemos atuar juntos ou, com certeza, vamos todos falhar separadamente.

A indústria no Brasil está começando a ser desenhada. Ainda existem muitos gaps legislativos e muito para ser estruturado. Mas o primeiro passo foi dado e acelerar esse processo só depende de nós.

As opiniões veiculadas nesse artigo são pessoais e não correspondem, necessariamente, à posição do Sechat.

Sobre o autor:

Cintia Vernalha mora nos EUA, onde conheceu e se apaixonou pelo mercado de cannabis. Com mais de 15 anos trabalhando na área comercial de grandes corporações como Nestlé, Reckitt Benckiser e EMS, hoje une a sua paixão pela planta, a sua experiência executiva e a sua vivência em um dos maiores mercados de cannabis para assessorar empresas que desejam atuar ou melhorar seu posicionamento no Brasil.