De mães que lutam pelos filhos a empresárias, mulheres transformam o mercado da cannabis

Mercado da cannabis tem desafios semelhantes a outros para construção de lideranças femininas, e sua transformação está conectada a mães que lutam por tratamento para os seus filhos.

Publicada em 07/05/2022

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Por Ana Carolina Andrade

A luta pioneira das mães que enfrentaram muitas barreiras para trazerem acesso à cannabis medicinal aos seus filhos e os desafios para atuar em um mercado ainda muito masculino foram debatidos por lideranças femininas no mercado da cannabis no quarto e último dia do Congresso Brasileiro da Cannabis. A discussão foi mediada por Jacqueline Passos, jornalista, responsável pela comunicação do portal Sechat.

Atuando no mercado europeu há alguns anos, Ana Luiza Rios, engenheira ambiental, sócio fundadora e diretora Executiva da Just Hemp CBD, acredita que a cannabis pode ser uma porta de entrada para as mulheres que querem empreender e precisam trabalhar, e que as mulheres têm muito a agregar à indústria, com o exemplo das lideranças que ocupam em empresas de sucesso no exterior.

Rios vê o acesso à cannabis hoje no Brasil restrito a um público de elite, que tem condições financeiras para pagar um tratamento, que para ela é um cenário distinto dos mercados em que trabalha, onde a cannabis não fica restrita a esse segmento da sociedade.  A engenheira diz que pretende continuar na luta para modificar as leis no Brasil, e acredita que a planta deve ser tratada como um fitoterápico. “Sonho que o meu produto esteja dentro de uma loja de produtos naturais, e não de uma farmácia para custar 3 mil reais”, disse.

Cannabis tem potencial para auxiliar nos problemas ambientais

Com uma carreira consolidada em empresas dominadas por homens, no ramo petroquímico, a engenheira química Bárbara Hedler, Co-CEO e membro do Conselho de Administração da Maeté, também trabalhou na Organização das Nações Unidas (ONU), e no mercado da cannabis se sentiu mais acolhida que nos outros espaços de trabalho da sua trajetória, e percebeu uma maior aceitação da mulher líder neste segmento.

Para Hedler, a cannabis tem um potencial para contribuir nas questões ambientais atuais. “Via na cannabis além do potencial médico, o da indústria transformadora. Como engenheira química acredito que precisamos promover a transformação da indústria, trazer novos meios para mudar as produções”, diz. Em sua empresa, ela atua no desenvolvimento de produtos com este objetivo, como bioplásticos, produtos voltados para a indústria de alimentos e têxtil, pela potencialidade da cannabis como planta multifuncional.

Barreiras do mercado da cannabis com o sistema financeiro levam a busca de alternativas

A CEO da Cannbax, Camila Nocetti, fundou sua própria empresa, a Indeov, e hoje trabalha em outro ramo do mercado da cannabis após ter identificado uma dificuldade na realização de operações financeiras. Seu trabalho hoje, em uma fintech, é lidar com estas barreiras, que percebeu na resistência apresentada pelos bancos tradicionais em trabalhar com o mercado da cannabis.

Nocetti trouxe dados sobre a participação das mulheres no mercado de cannabis e ocupação de cargos de chefia, que não só é menor do que a masculina como também vem caindo. “A gente está falando de um mercado consumidor liderado por mulheres nos EUA, e em 2021 a ocupação feminina caiu 22%, abaixou da média nacional, de 36,8%. [Nos EUA] 8% dos cargos de CEO são ocupados por mulheres. No Brasil, de 74 empresas, 176 cargos são ocupados por mulheres e 247 cargos são ocupados por homens. Estamos abaixo também da média do setor tradicional”, explica.

Mães que lutaram pela cannabis medicinal mudaram o mercado do país

Hoje uma trabalhadora do mercado da cannabis, Daiane Zappe, gerente executiva, da Revivid Brasil, se aproximou da área pois é uma das diversas mães que lutou muito para obter tratamento com cannabis medicinal para o seu filho.  Zappe relembra inclusive, que se há toda essa estruturação de mercado hoje, é pela luta de mães que foram buscar remédios para os seus filhos e desafiaram até o sistema judiciário.

Ela relata um sofrimento angustiante com a condição do filho frente aos tratamentos disponíveis na medicinal convencional na época, e que não apresentavam resultados ou melhores. “A cannabis medicinal traz qualidade de vida para a criança e para a família. Desde então a cannabis tem sido a minha luta. Se eu puder fazer a diferença na vida de uma criança, vou cumprir a minha missão e do meu filho”, acredita.

Há espaço para as mulheres no mercado da cannabis

O desejo de empreender e conectar seu trabalho com um propósito, junto da inspiração pela luta das mães de crianças autistas, levou Thaise Alvarez, CEO da Alma Lab a se aproximar do mercado da cannabis.

A importância de difundir informação científica e de qualidade para quebrar barreira do preconceito é uma das tarefas que Alvarez coloca, e acredita que as mulheres tornam o mercado mais dinâmico e inovador. “Nosso papel é mostrar que as mulheres têm condições sim, de empreender neste mercado”, diz. Ela ainda relata que muitas vezes é a única mulher presente em reuniões com parceiros da área.