Dar sentido para a dor cicatrizou meu sofrimento: diz Sabrina Kaster

Filha diagnosticada com síndrome rara chegou a tomar 15 gotas de rivotril, com 15 dias de vida, para controlar crises convulsivas

Publicada em 14/02/2023

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Por Leandro Maia

Agradecer e proporcionar o melhor para a Natália foram os primeiros pensamentos de Sabrina Kaster  depois de ouvir dos médicos que a filha era portadora de uma síndrome rara. Na UTI de um hospital em Porto Alegre-RS foi o local onde  a bebê passou o primeiro ano de vida. Diagnosticada com CDKL5, erro genético que causa mutações que comprometem o desenvolvimento cognitivo e motor, Natalia ajudou Sabrina a entender o porque tinha de enfrentar um desafio que não estava preparada. Nos primeiros 15 dias, a recém-nascida, em 2010, tinha fortes convulsões. 

Sabrina é graduada em Comércio Exterior, mas abriu mão da profissão se dedicar ao acompanhamento do tratamento da filha e a terapia canábica.

Após a suspeita das síndromes do espectro autista ou west terem sido descartadas, a equipe médica e muito menos a família sabiam com o que estavam lidando. Muitos medicamentos, nacionais e importados, foram testados em busca de controlar as convulsões. Natália chegou a ser medicada com 15 gotas de Rivotril (Clonazepam), usado para controlar transtorno do pânico, transtornos de ansiedade e convulsões. “Se eu tomar cinco gotas de Rivotril, eu durmo por dois dias. Agora, imagine uma bebê”, comparou Sabrina. 

Por causa dos tratamentos inadequados, com medicações fortes, ele sofreu interações medicamentosas. 

As convulsões

Em um dos períodos mais críticos, Natália chegou a ter  80 convulsões em um único dia, com paradas cardíacas. A cada ataque convulsivo, Sabrina pensava “será que minha filha vai voltar?”. 

"Minha filha foi tirada do meu colo com 15 dias. Eu via a minha filha recém-nascida duas vezes por dia. Imagina uma mãe não poder pegar a criança no colo para amamentar. Isso tudo foi tirado de mim”, desabafou. 

Segundo a mãe, que abriu mão da carreira na área de comércio exterior para poder se dedicar à Natália, o desconhecimento sobre como tratar o problema foi o mais angustiante. 

Natália ao lado da mãe Sabrina. (Imagem: Arquivo Pessoal)

“Aprender a lidar com um filho já é difícil, agora imagine um filho especial que traz uma série de limitações e situações que você não sabe lidar. Eu nunca tinha visto uma convulsão”, contou. 

CDKL5

A CDKL5 foi descrita pela primeira vez em 2004. Mas só em 2014, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) liberou o CID - Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde. A família foi descobrir que Natália tinha essa síndrome quando a criança completou três anos.   

"É uma síndrome de difícil controle.  A criança não consegue falar e nem caminhar porque esse erro é responsável pela proteína levada ao cérebro que é responsável pelas partes cognitiva e motora", explicou Sabrina.

A decisão pela cannabis 

Depois de inúmeras tentativas sem sucesso, Sabrina decidiu apostar na cannabis medicinal. “Eu só pensava que era um tratamento que poderia ajudar a minha filha. Não pensava em mais nada”, lembrou. 

Por causa da falta de regulamentação, foram muitos experimentos em busca de uma solução. Na ocasião, Sabrina conheceu outras mães que compartilhavam do mesmo problema. Foi quando decidiram formar um grupo para trocar informações. 

“Minha filha foi cobaia do tratamento alternativo, assim como outras crianças, porque 10 anos atrás não existia uma organização com informações precisas sobre como tratar a síndrome. Muitas coisas foram dadas para as nossas filhas em formato de experiência. O que dava certo para a filha de uma mãe, era dado para o filho de outra mãe. Assim nós fomos trocando informações até chegar no uso da cannabis medicinal”, contou.  

O novo começo

Após iniciar o tratamento com a planta, as crises foram controladas. No entanto, Natália ainda tem os sintomas da síndrome. No caso dela, a cannabis é importante para controlar as convulsões e proporcionar melhor qualidade de vida. 

Natália chegou ao mundo e levou Sabrina ao encontro da terapia canábica. Como terapeuta, ela ajuda outras famílias. Poder dar sentido para toda sua dor é o que a ajuda a entender melhor a  condição da filha.  

“Dar sentido a toda dor foi o que ajudou a cicatrizar meu sofrimento. Hoje, eu sei tudo o que vivi e não dói mais”, finalizou.  

Veja a entrevista completa: