Por Norberto Fischer
Dois pensamentos se destacam quando se analisa ou se escreve sobre as perspectivas do que poderá acontecer, o primeiro é atribuído ao Confúcio e diz “Se queres prever o futuro, estuda o passado”, e o segundo é do Presidente Americano Abraham Lincoln que disse “A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”.Então, vamos olhar incialmente o passado com alguns fatos ocorridos no Brasil nos últimos 10 anos que envolveram o assunto da planta Cannabis e seu uso medicinal:
CBD e THC reclassificados pela ANVISA, ou seja: duas das substâncias da Planta Cannabis mudaram da lista de proibidos para a lista de controlados;
Conselho Federal de Medicina autoriza a prescrição do CBD, com a publicação de portarias sempre com imediatas reações da sociedade e grande repercussão na mídia;
Receita Federal simplifica o processo de desembaraço aduaneiro desses produtos e amplia o valor máximo de importação individual, esta considerada isenta de impostos;
ANVISA cria marco regulatório para a produção de derivados da Cannabis de forma medicinal e declara não ser o órgão competente para regular o plantio no Brasil;
PL399 que trata da Cannabis Medicinal, avança entre muitas polêmicas e brigas, e depois de tantos debates na Câmara e no Senado, está lá parado, aguardando;
ANVISA autoriza a venda de diversos produtos da Cannabis em farmácias, incluindo um produto com percentual elevado de THC, em contradição com normas internas que não autoriza a importação com valores superiores a 0,3% de THC;
Cidadãos em todo o território nacional com ações na justiça, algumas já ganhas, por autorização para o auto cultivo da Cannabis, cultivo em associações, fornecimento do produto custeado pelo Estado e até pelo plano de saúde;
Universidades e instituições privadas oferecendo cursos de pós-graduação sobre a planta, cursos ministrados por ONGs para o auto cultivo, além de outros cursos e eventos voltados à comunidade médica sobre a planta e opções de tratamento;
Uso odontológico e veterinário da Cannabis ganha força entre os profissionais, avança e conquista espaço de destaque nas mídias;
Leis municipais e Estaduais aprovadas disponibilizando produtos gratuitamente, pelas farmácias de alto custo ou pelo SUS, além de leis que autorizam pesquisas com a planta; e
O uso medicinal saiu da bolha inicial de tratamento para Epilepsia e ganhou espaço em diversas outras aplicabilidades, tais como Parkinson e Alzheimer.
Esses itens são fatos, mas entre os avanços e as conquistas, sem nenhuma dúvida, o de relevância foi a conscientização da sociedade e de políticos em relação a planta, pois foi um período em que muitos preconceitos caíram por terra e a maturidade do debate cresceu, mesmo em segmentos da sociedade em que esse assunto praticamente não tinha espaço.
Por outro lado, o cenário brasileiro aponta que ainda existe um abismo enorme que precisa ser superado.
E para 2023, quais são as expectativas, o que se espera?
Se o Brasil conseguirá novos avanços significativos em 2023 ainda é uma incógnita e depende de muitos fatores, principalmente político.
No entanto, olhando para a quantidade de conquistas nos últimos 10 anos e percebendo que o ritmo de acontecimentos positivos é crescente, podemos esperar que o ano de 2023 se torne especialmente positivo.
Ampliando um pouco o tema cannabis medicinal e olhando mais amplamente a utilização de substâncias psicotrópicas, é evidente que a legislação brasileira busca prioritariamente coibir o consumo e a circulação de entorpecentes, que conflita os direitos das pessoas que necessitam da utilização desses produtos de forma medicinal.
A pressão da sociedade para avançar no uso da Cannabis provocou a necessidade de incorporar às leis e regulamentações temas antes não considerados, como o consumo para fins médicos, plantio em território nacional, ampliação das pesquisas, entre outros.
Por um lado, a sociedade está clamando por mais liberdade, quando se entra nesse mundo das drogas e de produtos proscritos, por outro existe a cultura de controle instalada no Estado Brasileiro com focadas na exceção e no paradigma da criminalidade, ou seja, ampliação do controle do Estado sobre o cidadão e a criminalização de atos que deveriam ser livres por direito fundamental.
Enquanto os gestores públicos estiverem atuando sob esse paradigma, todo e qualquer avanço será bem-vindo, mas sempre deixará um sentimento de frustração e burocracia associados em cada nova conquista.
Por enquanto, para 2023 o passado e os indicadores apontam que:
- A sociedade conhecerá ainda mais a planta e suas potencialidades;
- O assunto ganhará mais força e presença nas rodas de debates e estudos dos médicos;
- As pesquisas serão ampliadas, incluindo parcerias público/privada e universidades/empresas.
Além disso, mais pessoas na sociedade passarão a entender o seu direito de escolher como se tratar e que todas as opções de acesso à Cannabis deverão estar disponíveis ao cidadão:
- Importação;
- Plantio e produção nacionais;
- Auto cultivo; e
- Fabricação em laboratório.
E, claro, teremos avanços iniciais nas áreas industriais e de alimentos.
As perspectivas são positivas e os avanços serão resultados da nossa atuação, da cobrança e pressão sobre os políticos e demais gestores públicos.