Maior dificuldade da cannabis medicinal é a falta de informação, diz Dr Pedro Pierro Neto

Publicada em 02/08/2019

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Em um bate-papo descontraído e importante, o Dr. Pedro Pierro, colunista do portal Sechat, concedeu entrevista à Rádio Cacique de Capão Bonito e região, quando conversou com o apresentador Ivo Ricardo sobre a utilização da cannabis para fins medicinais no Brasil. Durante a conversa, que aconteceu em junho, o médico neurocirurgião falou sobre as diversas opiniões que existem sobre o assunto e sustentou que a solução para o preconceito sobre a cannabis é a informação. Pierro também falou sobre os efeitos positivos da medicação e do maior empecilho para a regularização no país.

Ouça a entrevista

Ivo Ricardo: Dr Pedro, a Anvisa acabou de aprovar uma consulta pública sobre o plantio de cannabis e a produção de medicamentos a partir da planta. Qual a importância disso?

A gente teve uma reunião na Anvisa a respeito sobre o plantio de cannabis e a produção de medicamentos no Brasil. Hoje já é possível utilizar a cannabis medicinal de forma terapêutica, mas o acesso é muito limitado e consta somente com medicamentos importados, o que tem um custo elevado. A ideia da produção nacional é conseguir democratizar o acesso. A importância é que começamos a conversar com a Anvisa e ter um alinhamento, ainda estamos muito longe de conseguir uma normatização que corresponda com o perfil da nossa sociedade e daquilo que realmente a gente precisa.

Você está à frente de um portal de notícias sobre cannabis medicinal, o Sechat. Qual o objetivo deste portal?

Eu prescrevo medicações a base de cannabis há cinco anos e uma dificuldade muito grande que eu encontrei foi a falta de informação. Não faltam estudos sobre a utilização da cannabis medicinal, mas estavam faltando no Brasil um ponto de convergência, em que médicos, pacientes e familiares pudessem se informar um pouco melhor sobre a cannabis medicinal e então tivemos a ideia de fazer um portal. Sechat é o nome de uma deusa egípcia que utilizava a folha da maconha para a fabricação de papiro e isso desde o Egito antigo. Esse portal a gente consegue colocar matérias em um contexto geral de tudo que se fala da cannabis medicinal no Brasil e no mundo.

A cannabis está sendo usada para tratar diferentes doenças, desde epilepsia até o parkinson. Como isso é possível? De que forma a maconha age no nosso corpo?

O mesmo remédio que pode ser usado para epilepsia, parkinson, alzheimer, esclerose múltipla, depressão, ansiedade, dor crônica isso não existe. Na verdade existe, porque nós temos no nosso corpo um sistema chamado endocanabinóide que é onde a cannabis medicinal vai atuar. E esse sistema é um sistema chamado de finalização celular, que avisa para o neurônio aquilo que o neurônio está precisando. Então a gente consegue modular dentro do próprio organismo para que a gente tenha os neurotransmissores necessários para um melhor controle de toda essas doenças mencionadas. Não é que funciona como remédio, funciona como um aditivo dentro de um sistema que é próprio de todos os mamíferos.

Quais são as formas de uso da cannabis medicinal?

Hoje o que temos liberado no Brasil é o uso oral, pode ser por óleo ou comprimido, e o que a gente luta é que se estenda para outras formas de administração, como pomada e supositório, porque nós temos pacientes que não aceitam a forma oral ou não conseguem engolir o comprimido, ou acaba não tendo uma boa aceitação com o óleo e de repente colocar um adesivinho na pele funcionaria muito bem. Mas atualmente o que permite a legislação brasileira é o uso oral e em alguns casos o uso de pomada.

Hoje, um paciente que precisa de tratamento com cannabis, o que ele precisa fazer?

A Anvisa tem, no seu próprio portal, a parte importação de canabidol que esclarece os requisitos necessários para isso. É exigido quatro documentos, dois deles são encontrados diretamente no site da Anvisa, que é um formulário de identificação (que é onde você coloca do paciente e do médico que está prescrevendo) e uma declaração de responsabilidade de estar ciente que é uma medicação que não tem registro no Brasil e para uso pessoal, que não deve ser ministrado para outros pacientes. Depois, é preciso uma receita médica e um laudo médico, onde você vai colocar o por que da utilização da cannabis medicinal, pois a Anvisa sinaliza que seja utilizada como uso compassivo (a gente já utilizou os métodos tradicionais de tratamento e não teve uma resposta terapêutica adequada, e por isso utiliza-se uma forma não regulamentada, que é o caso da cannabis medicinal).

Por que a cannabis medicinal ainda não está regulada no Brasil?

Eu não vejo uma razão ainda do porquê esse remédio ainda não tenha uma regularização nacional e na verdade, até existe, porque você consegue encontrar um remédio derivado da cannabis em farmácia normal, é a utilização de uma receita especial tipo A e que custa para o Brasil mais de R$ 2.500,00. O problema não é a regulamentação e sim o acesso. Essa medicação que só se consegue por encomenda e o que estamos pedindo é que esse tipo de medicação seja produzida no Brasil para ter um custo mas acessível. Mas, já existe grandes laboratórios a entrada dessas medicações em farmácias normais, dessas que a gente encontra no dia a dia.

Qual a origem do preconceito?

A palavra preconceito já diz que é um pré conceito, um conceito pré estabelecido antes de tomar conhecimento. Isso é uma busca que a gente busca dentro do portal Sechat, trazer esse conhecimento para que a gente possa discutir esse preconceito. Vamos colocar o estudos na mesa e debater de forma científica, sempre colocando à frente aquilo que é o mais importante que é o paciente. A cannabis medicinal não vai salvar o mundo, não funciona para todos os pacientes, mas é uma ferramenta útil e que tem grandes possibilidades de melhores em todas as patologias e com efeitos colaterais muito menores que as medicações que encontramos por aí. Então por que conversar sobre esse assunto? O que eu mais quero é que as pessoas que não são a favor venham para o nosso debate e conversem com a gente para esclarecer dúvidas e acabar com o preconceito, para que assim os pacientes tenham o direito de experimentar uma opção terapêutica muito eficiente.